Afinal, para que serve o design?

A função do design não é ser apenas atraente ou usado para converter leads. Sua utilidade vai muito além disso. Nesse artigo você vai descobrir que o design tem pelo menos três funções diferentes e igualmente importantes.

Você acorda e desliga o despertador do celular. Em seguida se levanta, lava o rosto com sabonete, escovas os dentes, troca de roupa e vai para o trabalho. Desce o elevador, sai no carro e encontra uma vaga para estacionar. Todas essas ações simples do seu dia a dia são cercadas por design. Sim, tudo o que você consegue imaginar!

Afinal de contas, foi preciso a cabeça pensante de um designer para solucionar e facilitar problemas do seu cotidiano como, por exemplo, projetar placas para que você pudesse identificar se a vaga onde estacionou era ou não permitida. Além de todas as embalagens, produtos, roupas, veículos, produtos e etc que cercam o seu dia.

É comum que muitas pessoas que não são da área achem que a profissão do designer esteja atrelada a criar coisas bonitas, diferentes ou apenas colocar uma ideia no papel. Mas isso é só a ponta do iceberg, existe um imenso trabalho feito muito antes do projeto tomar forma.

Além da noção estética, o designer precisa compreender a fundo quais dores o projeto que está desenvolvendo deseja solucionar e ser ativo na hora de tomar decisões. Não basta apenas criar, a criação precisa coincidir com os objetivos reais do projeto.

Reduzir o designer a apenas escolher uma fonte legal ou usar a cor favorita de alguém é ignorar todo o potencial estratégico que o design possui.

Qual é a função do design?

Você provavelmente já ouviu alguém dizer que design é a soma de forma e função ou, para os mais práticos, que a forma acompanha a função. Mas aqui vamos aprofundar um pouco mais nesse conceito e citar pelo menos três níveis de função que o design possui.

Segundo Bernd Löbach, autor do livro “Design Industrial”, um bom design deve atender a pelo menos três funções:

  • Prática;
  • Estética;
  • Simbólica.

Vamos entender sobre cada uma delas.

➔ Função Prática

A função prática é que mais conhecemos, são os aspectos fisiológicos do produto, ou seja, ele deve atender a uma necessidade de uso.

O design que atende à função prática é aquele que tem boa usabilidade.

Por exemplo: A função prática de uma faca é cortar, certo? Ela precisa ter uma lâmina afiada e um cabo que possibilite a pessoa segurar firmemente.

A função prática de uma faca é cortar

Uma cadeira deve ser confortável para sentar. No exemplo a seguir temos uma cadeira típica das comunidades Shaker de 1840. Repare que ela tem funções práticas bem definidas:

  • O encosto forma um ângulo reto com o assento para manter as costas do usuário em posição ereta;
  • Os pés e hastes laterais proporcionam firmeza e estabilidade;
  • Tem uso econômico de materiais e um processo de fabricação de custo mínimo.

O único detalhe estético são os recortes curvos nas peças do encosto e a alternância de cor no trançado do assento.

A função prática de uma cadeira é ser suficientemente confortável para que o usuário possa se sentar

Um cardápio precisa informar o prato e o preço de cada item.

A função prática de um cardápio é informar o prato e o preço de cada item.

A função prática de cada peça de design precisa ser avaliada segundo a sua usabilidade.

Segundo Löbach “Os produtos possuem diversas funções, que podem ser hierarquizadas pela importância. (…) A função
principal está sempre acompanhada de outras funções secundárias de acordo com as múltiplas necessidades e aspirações dos usuários”.

➔ Função Estética

A função estética já é aquela atrelada aos nossos sentidos, é o que o designers chamam de “forma”.

Ela não é necessariamente ligada à beleza (até porque beleza é subjetivo), mas sim a como percebemos um design. Seja através da visão, audição, tato ou qualquer outro sentido, a função estética vai mexer com a nossa experiência e apreciação.

Geralmente a função estética é a primeira a despertar alguma reação nos usuários. Cores, formas, tipografias, texturas, sons e muitos outros são exemplos de elementos da estética.

O design de qualquer produto (seja físico ou online) deve ser projetado para que os elementos estéticos se relacionem de forma harmoniosa e cumpram a função de atrair a atenção e seduzir os usuários.

Para os que acreditam que a forma acompanha a função, precisamos admitir: uma design voltado simplesmente
para o funcional não é a única (e talvez a melhor) estratégia de cativar o usuário e de assegurar a sua plena identificação com o objeto.

As formas de um carro, por exemplo, são vistas e avaliadas antes mesmo que se saiba as suas características técnicas, como potência ou consumo.

As características estéticas de um carro são apreciadas antes mesmo que se saiba suas configurações técnicas

A função estética:

  • É a relação entre um produto e um usuário no nível dos processos multisensoriais;
  • Contribui para atrair a atenção do receptor;
  • Provoca um sentimento de aceitação ou rejeição do produto;
  • Cativa o público;
  • É um fator de decisão de compra.

A estética desperta o lado humano emocional, primitivo e ágil. Se ela não estiver alinhada aos desejos do público dificilmente ele dará uma chance para entender se aquele produto é, de fato, bom ou não.

Não basta ser, é preciso parecer.

➔ Função Simbólica

A  simbólica é a mais complexa das três funções do design. Ela diz respeito à associação que o usuário faz através de um símbolo.

Um símbolo é um portador de um significado. Ele pode ser uma forma à qual um grupo determinado de pessoas dá um significado especial. É o que, por analogia ou convenção, representa, sugere ou substitui outra coisa.

O que o logotipo abaixo te lembra?

Logotipo da Apple

Um consumidor percebe o símbolo de uma empresa quando algo o faz lembrar das suas experiências com essa marca.

O produto torna-se um portador de significado que expressa algo sobre os hábitos de vida dos que o usam ou consomem. Pode dar uma ideia sobre a profissão, nível de renda, formação escolar, tribo da qual faz parte e etc.

Bolsa com a textura clássica da marca Louis Vuitton

Um objeto tem função simbólica quando a espiritualidade da pessoa é estimulada pela percepção deste objeto, ao estabelecer ligações com suas experiências e sensações anteriores.

"Símbolo é algo que representa outra coisa para alguém."

A cor vermelha em um semáforo é um sensação, um elemento estético, mas está relacionada com a ideia de perigo e advertência na cultura ocidental. Nesse contexto, mais do que experiência o vermelho é um símbolo, algo que lembra ou indica um conceito.

Sinal vermelho é um símbolo de perigo

Lembra da vaga de estacionamento do início desse artigo? Quando olhamos essa placa redonda, vermelha e com a letra “E” cortada ao meio ela automaticamente nos emite uma mensagem de acordo com o que já conhecemos dela. Ou seja, é carregada de função estética, mas também simbólica porque nos emite uma mensagem não direta.

A placa de trânsito simboliza a mensagem a ser passada

A função simbólica dos produtos:

  • É determinada por todos os aspectos espirituais, psíquicos e sociais do uso;
  • Deriva da estética do produto;
  • Se manifesta por meio de elementos estéticos como forma, cor, textura para produzir o efeito simbólico pretendido.

"[O designer] deve conhecer as múltiplas necessidades e aspirações dos usuários e grupos de usuários, de forma a poder dotar o produto com as funções adequadas a cada caso"

O designer é um tradutor

Imagine que uma marca fale uma língua e o público fale outra. Em determinado momento essa marca irá precisar de alguém que traduza esses “idiomas” para que ela possa se comunicar melhor com o seu público. Essa é a missão do designer! Ele traduz tudo aquilo que uma marca é para uma linguagem visual que se conecte com as pessoas.

O design é, portanto, uma ponte entre a estratégia de um projeto e como este se apresenta para o mundo e, para que essa ponte seja construída de maneira eficiente, é preciso fazer um diagnóstico amplo de onde se quer chegar

Através do design as pessoas constroem suas primeiras impressões como:

  • Essa marca é pra mim?
  • Eu consigo perceber a qualidade desse produto/serviço?
  • Essa marca se preocupa com seus consumidores?
  • É uma marca divertida ou séria? Moderna ou tradicional? Jovial ou madura?
  • É uma marca que eu gostaria de atrelar ao meu estilo de vida?
  • Me sinto motivado a consumir essa marca?
  • Nós compartilhamos dos mesmos valores?

A entrega final do design é o layout, mas todo o trabalho começa bem antes de abrir o software. O profissional passa por diversas etapas como: briefing, diagnóstico, pesquisa, geração de ideias, conceito, testes, rascunhos, definições iniciais, refinamento antes de finalmente chegar na apresentação.

Profissionais de design que possuem o olhar estratégico para identificar os problemas que o projeto deseja solucionar e traçar a melhor maneira de alcançar esse objetivo com certeza são os que fazem a diferença no mercado.

"Design bom é design que converte". Será?

Muitos atrelam o design somente ao lucro, o colocando acima do bem estar das pessoas sem preocupações com a segurança, ambiente ou impactos sociais, culturais e políticos.

Mas a verdade é que o design nasceu para servir às pessoas.
Solucionar problemas, facilitar o dia a dia, melhorar as dinâmicas sociais, tudo isso faz parte da missão do design.

Precisamos pensar em tudo o que pode impactar negativamente na percepção das pessoas, até mesmo quando elas não estão consumindo. O Brasil é o país com a maior taxa de pessoas com transtorno de ansiedade do mundo e isso é potencializado pela redes sociais, pelo excesso e informações e pelo estímulo ao consumo. Encarar as pessoas como códigos de barras ambulantes tem deixado a nossa população doente.

E não só isso. Se preocupar apenas com a conversão faz com que a comunicação de todas as marcas repita uma fórmula pronta. O resultado disso é um imenso mar de resultados pasteurizados e comuns.

O publicitário Washington Olivetto, em entrevista recente à Folha de S.Paulo disse que “a publicidade brasileira está exageradamente preocupada com aferição e métricas, muitas vezes deixando de lado aquilo que provoca os grandes resultados, que possam ser orgulhosamente aferidos e metrificados”.

Vivemos a era do consumo estimulado por criações medíocres e voláteis onde a função prática é a única que reina sem deixar espaço para o sentir.

Para finalizar vou deixar aqui uma frase do Löbach:

"Os objetos utilitários são usados também para satisfazer as necessidades estéticas. Com frequência, esta necessidade não é reconhecida e é suplantada por outras 'mais necessárias à vida'. A verdade é que a satisfação das necessidades estéticas não é necessária para nossa existência física, mas à nossa saúde psíquica."

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Itamara Ferreira
Designer, criadora do Leiautar e especialista em diálogos delirantes. Adora ouvir pessoas apaixonadas pelo que fazem e acredita que o design está em tudo e é para todos.

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